ÓRGÃO OFICIAL DO COMITÊ CENTRAL DO PARTIDO COMUNISTA DE CUBA



 No centro da Franja de Gaza está o depósito de cadáveres do hospital dos Mártires de Al-Aqsa, em Deir al Balah. À frente dessa dependência, uma mulher segura um envoltório branco e miúdo. Dentro está o corpo de sua filha Zena Naser.
 Parece que a mãe vai desfalecer, cabeça ladeada, olhos fechados, uma veia canalizada na mão direita, o rosto ferido por uma pena que atravessa as barreiras de qualquer língua ou cultura. O fotógrafo flagra para uma agência de imprensa esse instante dilacerador da despedida, essa maneira em que uma mãe morre estando viva.
 A foto chega aos meios do mundo. Google a publica meio apagada mediante SafeSearch, sob a advertência de que a imagem «pode incluir conteúdo explícito». Não há sangue, não há vísceras, porém a devastação de uma mãe é uma mensagem poderosa.
 Parece que um ano depois de que se iniciasse esta brutal escalada do extermínio sionista contra o povo palestino, o resto da humanidade continua enxergando Gaza de forma desencaixada ou apagada. A dupla moral que está na moda prefere não escutar bem, ver menos e dizer nada perante mais de 16.500 crianças mortas em apenas 12 meses, o número mais alto para conflitos armados dos últimos 18 anos. É apenas uma das vertentes nefastas do crime israelense, mas, sem dúvidas, das muito mais terríveis.
 Que outro sem-sentido é necessário para entender o horror perante o relato de Leila Al Kafarna? Leila é a mãe de Malek. Malek tem 13 anos. Caminhavam tomados da mão quando um bombardeio os surpreendeu em meio da rua. Após acordar do atordoamento causado pela explosão, ela começou a correr, enquanto gritava a seu filho que a seguisse, antes de que caíssem novas bombas.
 Mas ela sentia que Malek estava ligeiro, muito ligeiro. Quando olhou para trás, acabou entendendo que o único que ela segurava era o braço do filho. Metros atrás, seu filho gritava, mutilado.
 Lido em um órgão influente da mídia, ou talvez reproduzido em outros, o testemunho de Leila é mais um caso dilacerante sobre a consciência do mundo.
 Gaza é, agora mesmo, território do desespero. Aos números exorbitantes de mortos, feridos, desaparecidos e deslocados, se acrescenta a destruição de lares e todo tipo de infraestrutura civil, a falta de recursos, a fome, a sede, a desnutrição... É preciso voltar ao sofrimento da infância, uma a outra vez: em apenas um ano se tem duplicado o número de crianças que estão precisando de apoio psicossocial e de saúde mental.
 É preciso pensar em Gaza, no medo sem incentivos, no golpe de perder tudo, até a Pátria; nos médicos operando sem anestesia sobre mesas de cozinha; nas pessoas esmagadas pelos escombros; na impotência de ser reduzido à nada, somente porque outros cobiçam tua terra, teu lar.
 Sintamos a solidão de Gaza, o pranto, o grito, o suor e o sangue, sem outra resposta que mais projéteis. Que o tempo não nos torne insensíveis. Que seu clamor trespasse os nossos sentidos, enquanto houver espanto, enquanto doer o amanhecer.