ÓRGÃO OFICIAL DO COMITÊ CENTRAL DO PARTIDO COMUNISTA DE CUBA

Em 20 de maio de 1902, nos inícios do século 20, a bandeira da estrela solitária devia substituir à das múltiplas estrelas dos Estados Unidos. Mas, um incidente perturbou a abafada alegria do momento: a bandeira que aparecia não era a que viria a estrear a República, mas sim a estadunidense.

Brevemente foi esclarecido o fato. As autoridades norte-americanas tinham hasteado a deles de momento, a fim de deixar constância gráfica do fim da intervenção que alguns pensavam estava terminada. A esperada calma voltou, mas o fato deixou o sabor da verdade: a mudança era mais aparente do que real. As duas grandes catástrofes nas fileiras revolucionárias cubanas: a queda em combate de José Martí, em Dos Rios, em 19 de maio de 1895, após ter sido designado major-general, chefe do levante; e a morte de Antonio Maceo, às portas de Havana, em 7 dezembro de 1896, após completar a decisiva façanha da invasão da Ilha do Oriente ao Ocidente, foram um alerta para Washington. Devia completar seus planos, pois a fruta estava madura. O presidente McKinley devia apressar a intervenção.

Desde 1805, já o presidente norte-americano Thomas Jefferson advertia ao embaixador inglês em Washington que, caso se travar uma guerra contra a Espanha, os Estados Unidos se apoderariam de Cuba. De diversas maneiras, já tinha expressado suas intenções, ainda antes de ser eleito como terceiro presidente da jovem nação.

No início do século 20, em 1902, os Estados Unidos codificaram já as futuras relações com Cuba, através da Emenda Platt, imposta pela intervenção.

Nos fins desse mesmo século Washington tentou, com a lei Helms-Burton, restaurar os códigos de suas passadas relações com a Ilha, quebrantados desde 1959. Tais documentos projetam uma reveladora imagem da histórica mudança e uma pretensa transição ideológica. Desde 1823, o secretário de Estado do presidente Monroe, John Quincy Adams, escrevia no mesmo tom pré-imperial que as Ilhas antilhanas, por causa de sua posição geográfica, eram apêndices da América do Norte.

NUNCA FOI PROVADO QUE A ESPANHA FIZESSE EXPLODIR O MAINE

Os sucessores destes próceres foram consequentes com tais ideias e prepararam a Resolução Conjunta do Congresso, Já estava na hora de começar a guerra contra a Espanha à que se tinha referido Jefferson. O pretexto foi fazer explodir em Havana o encouraçado Maine, em fevereiro de 1898. O famoso historiador Howard Zinn escreveu que “jamais se apresentou uma prova acerca da causa da explosão que matou mais de 268 homens”. (1)

Zinn também faz menção disso como pretexto para entrar na Segunda Guerra Mundial, apesar da literatura antibélica, não as invasões pelos nazistas de outros países ou pelo holocausto dos povos como o judeu. (2)

Trata-se, acrescenta, de uma autoprovocação, como a de Pearl Harbor, no Havaí, e “a ofensiva vietnamita e o episódio do golfo de Tonkin era falso e inventado por Johnson.” (3).

Em 1901, o Congresso aprovou a Emenda Platt. Em 20 de maio de 1902, consumou-se no impressionante Palácio dos Capitães-generais de Havana — hoje Museu da cidade —, a transição cubana, de colônia para neocolônia.

Essa data marca para Cuba o fim da etapa colonial. Mas também significou o início da luta contra a nova metrópole, como anunciaram Martí e Maceo.

Em 1868, o levante de 10 de outubro tinha sido o início das guerras de independência de Cuba. A maturidade política atingida por alguns latifundiários das províncias orientais e fatores como a influência da Revolução Francesa, criaram as condições para a luta armada pelo progresso socioeconômico, à emancipação e a abolição da escravatura.          

Carlos Manuel de Céspedes — o Pai da Pátria — pertencia ao grupo de latifundiários de Bayamo, iniciadores e executores do Grito de Yara. A tomada de Bayamo, em outubro de 1868, foi a primeira vitória militar dos mambises, cujas forças se nutriram com milhares de brancos, negros e mulatos libertos, os que se incorporaram à luta e deram ao levante um indubitável matiz popular do qual careceram os Estados Unidos, pois seus líderes preferiram manter a escravatura dos afro-americanos. Céspedes aplicou em Bayamo o decreto que libertava os escravos. Assim começou a contenda cubana, diferenciada de sua predecessora; a norte-americana, onde os líderes como Jefferson e o próprio Washington mantiveram a escravatura, ainda após ter sido atingida a independência.

Desde 1895 era tão iminente o triunfo das armas cubanas contra o extenuado exército espanhol, depois de quase 30 anos de guerra em duas etapas e a heróica invasão dos generais Maceo e Gómez, que o governo de Mc Kinley enviou um ultimato à Espanha. Deu-lhe um prazo para outorgar a autonomia a Cuba, com a ideia de poder comprá-la. A Coroa substituiu o sanguinário Weyler como governador e informou aos EUA que tinham adotado a decisão solicitada por eles de conceder a autonomia a Cuba, sob um protetorado. A rainha assinou o decreto da autonomia, em 24 de novembro de 1897, com vigência a partir de 1º de janeiro para evitar o que consideravam um mal maior, que os cubanos atingissem a liberdade com sua luta. No entanto, todo mundo sabia que não a concederiam y ainda menos a independência, como exigiam os insurretos. Tal situação inspirou a Resolução Conjunta do Congresso e foi “a fruta madura”, para justificar a guerra.

O REINO DE HAVAÍ UM SUBPRODUTO PARA MC KINLEY

A explosão do Maine e a propaganda escandalosa que fizeram os Estados Unidos facilitaram a intervenção. O governo do liberal Sagasta, tal como o do conservador Cánovas, achavam que era mais conveniente para seus interesses contemporizar com o inimigo anglo-saxão, em vez de escutar as vozes que na própria metrópole exortavam o governo a admitir que a guerra estava perdida e reconhecer a independência pela qual lutavam os cubanos; facilitaram os planos norte-americanos ao render-se a Washington, que engoliu as Ilhas de Cuba e de Porto Rico e como expansão deliberada para o oceano Pacífico incrementou a rapina apanhando as Filipinas, a ilha Guam e várias pequenas Ilhotas. Um subproduto da intervenção foi a anexação do Havaí, onde cinco anos antes os fuzileiros tinham derrubado a rainha Liliuokalani, para começarem a “transição”. Na realidade, no dia 10 de dezembro de 1898; Cuba não conseguiu a independência pela qual perderam a vida 300 mil cubanos, deles 10.635 soldados mambises. A guerra fez aumentar o expansionismo norte-americano, outorgando-lhe a vitória total com a assinatura do Tratado de Paris onde, ignorando a luta crioula, partilharam o butim de guerra. Os Estados Unidos deviam pagar 20 milhões de dólares daquela época à Espanha, como compensação.

O arraigado espírito independentista cubano impediu a anexação. O país passou para as mãos dos EUA sob a presidência de Tomás Estrada Palma, quem tinha solicitado a intervenção desde 1869 e a reiterou em 1878 e 1884. Os ocupantes criaram as bases legais para a intervenção militar dos Estados Unidos, incluíram na Constituição de 1902 a Emenda Platt. Essa exigência privou de independência os cubanos, destruiu o Partido Revolucionário que se fragmentou em fracos grupos, outorgou dezenas de concessões a empresas dos EUA e foi estabelecido um modelo de dominação econômica dependente de Washington.

Este modelo foi completado por Tomas Estrada Palma. Através dele se instaurou o lucrativo Tratado de Reciprocidade Comercial, que esteve vigente desde 1904 até 1934.

AS PRIMEIRAS INTERVENÇÕES

A reeleição fraudulenta de Estrada Palma, em 1906, deu motivo a uma revolta liderada por veteranos da guerra; Dom Tomás solicitou outra intervenção norte-americana e Theodore Roosevelt, vigésimo sexto presidente dos Estados Unidos enviou ao secretário da Guerra, William Taft e vários navios. Estrada Palma demitiu em 29 de setembro e Taft foi nomeado governador-geral, pelo artigo 3º da Emenda que levava seu nome e duas semanas depois Charles Magoon substitui a Taft e se manteve até 1909. A partir disso, os capitais dos EUA se ampliaram e fortaleceram. A Emenda Taft foi derrogada em 1934, após renegociações e de incessantes protestos dos cubanos. Mas seu desaparecimento não acabou com a ingerência dos Estados Unidos nas questões internas do país; pelo contrário, surgiram novos mecanismos. Desde 1928, os norte-americanos eram donos da indústria açucareira, os serviços públicos, as ferrovias, as jazidas, a indústria do fumo, os serviços públicos, os hotéis, o jogo, os entretenimentos, o comércio e a agronomia, muitas das usinas, os imóveis, a divida pública, até o triunfo da Revolução de 1959.

A lei Helms, aprovada em 1995 pelo presidente Bill Clinton, foi redigida por advogados da firma Bacardí e apresentada pelo senador Jesse Helms, depois de um sinistro processo organizado pelos grupos da extrema direita de Miami. Chamada já por alguns de Lei Bacardí outorga ao Congresso dos Estados Unidos a faculdade de determinar quando, sob múltiplas exigências, um governo de Cuba é legítimo.                   

A lei já não só é extraterritorial contra Cuba, mas também contra a soberania de todos os países.

Ao restabelecer as relações diplomáticas, o presidente Barack Obama não foi capaz de parar essa guerra não declarada, apesar de ter implementado algumas ações positivas, mas que se revelam insuficientes. Porém, não podem ser implementadas enquanto persistirem as medidas econômicas de guerra como o bloqueio, mais severas que as implementadas contra os que financiaram os nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, protegidos pela gangue de Preston Bush. Agora, desde 1959 lembramos cada dia 20 de maio, para dizê-lo com palavras do poeta Nicolás Guillén, tal como prometeram José Martí e Antonio Maceo. E que Fidel Castro fez cumprir: Aquela Cuba já acabou. Acabou para sempre aqui. O chicote de couro com que os ianques batiam em nossas costas. Acabou de vez.

(1) Howard Zinn. La otra historia de los Estados Unidos. Editora Ciencias Sociales 2004. p. 218.                  

(2) Ibidem pp, 297-298

(3) Ib. p, 349

Pies de fotos...

A bandeira dos EUA içada antes do que a cubana, em 20 de maio de 1902, em Havana.

A explosão em Havana do encouraçado Maine, em fevereiro de 1898, foi o pretexto utilizado pelo governo dos EUA para intervir na guerra cubano-espanhola. Na foto, o navio de guerra entrando na baía de Havana.