
QUANDO apenas sua estatura era de um metro, Yordanis Rey provou o vinho pela primeira vez. Foi em casa do pai, onde bebeu um gole de uma garrafa guardada no banheiro. E o vinho ficou no sangue do menino.
Tal como o escritor argentino Jorge Luis Borges, um dos autores mais destacados da literatura do século 20, este morador da cidade de Camagüey, descendente de andaluzes, pediu ao vinho que lhe ensinasse a arte de ver sua própria história e, tal como o grande romancista norte-americano Ernest Hemingway, descobriu que essa é a coisa mais civilizada do mundo.
Tanta força ganhou a tradição da família Rey Calatrava, que tinha emigrado da região de Xaém, na Espanha, e que plantou parreiras no oriente cubano, que acabou achando um lar em “Bodegas del Rey”, uma pequena indústria pertencente ao programa da Pequena Agroindústria, do Grupo Nacional de Agricultura Urbana, representada pela Empresa Agropecuária de Camagüey.
Através de métodos artesanais, a pequena empresa dirigida por Yordanis Rey se especializa na elaboração de vinagres, vinhos secos de cozinha, de mesa e licores, além de outros produtos que quase sempre são importados no país e destinados ao consumo social.
Segundo explica o vinicultor, na Ilha existem conhecimentos sobre vinhos internacionais, mas se ignora a própria videira cubana, que vem sendo trabalhada, há tempo, de forma artesanal.
Segundo as palavras do engenheiro, “Bodegas del Rey” defende novas propostas, não só para o amplo mercado nacional com que já contam, mas para introduzi-las no setor turístico, que oferece excelentes oportunidades para o desenvolvimento de uma prática que une cultura e identidade, de forma genuína.
Ao referir-se aos primeiros vinhos artesanais, que se estão apresentando ao turismo, o empresário garante que é um desafio e ao mesmo tempo uma enorme oportunidade mostrar o vinho cubano a um mercado estrangeiro que conhece bem essa bebida. “Às vezes, o ramo turístico não consegue mostrar ao visitante um produto local, que existe e não é explorado adequadamente”, aponta.
Sabido é que, também, a pequena usina que possui uma capacidade produtiva de 26 mil litros mensais, encontra variados concorrentes no chamado Primeiro Mundo, do Velho e Novo continentes, porque em Cuba há fornecedores tanto da Espanha quanto do Chile ou da Argentina. Contudo, Yordanis Rey reitera que a autenticidade é o principal valor do que produzem.
IN VINO VERITAS
Teve razão Plínio o Velho ao concluir que no vinho radica a verdade, há quem diga que pelo poder que tem para desinibir ou talvez porque só com prová-lo se sabe se é ou não um bom vinho. E também não errou o inventor da penicilina ao afirmar que o vinho torna felizes os seres humanos. Muito esperto o dr. Fleming.
Por isso, Yordanis Rey sabe também que da qualidade depende o sucesso da bebida que vende, seja dentro ou fora de Cuba, seja para conterrâneos ou para estrangeiros. “Temos que convencer o cliente do bom que é o produto. Preocupamo-nos por uma estética do bom gosto, mas sem sair do lado artesanal. Há quem compare as garrafas que temos com as de outras nações e não se trata disso. Queremos que se saiba que fazemos vinhos artesanais, mas saborosos vinhos”, aponta.
Acaso quem não teve um avô, um pai ou um primo que tenha feito um garrafão de vinho, a partir da uva ou de outros fermentos?”, esclarece o especialista. “A tradição que seguimos é única e nos reafirma. Fazemos um produto artesanal, mas devidamente examinado e certificado pelo Centro Nacional de Inspeção da Qualidade e pelo Registro Nacional de Higiene dos Alimentos”.
Convencido de que “Bodegas del Rey” terá impacto na arena doméstica e estrangeira, Yordanis, responsável por uma dúzia de trabalhadores, acrescenta que em nível nacional tem que continuar explorando cada detalhe para a produção e comercialização dos vinhos, de acordo com as possibilidades de cada território.
Se bem têm videiras próprias, campos experimentais, utensílios, os de “Bodegas del Rey” se apoiam em parreiras de conhecidos lugares das colinas da Serra Maestra, no oriente cubano, e na ocidental província de Pinar del Río, bem como em alguns produtores da verdadeira uva de Camagüey, que se dá na região de Nuevitas, ao norte dessa central província. “Estamos tentando aclimatar outras vides na região de Vueltabajo, em Pinar del Río, e em Soroa (território de Artemisa, no ocidente do país), que tem bons plantios”, acrescenta o entrevistado.
Em uníssono, crescem “Bodegas del Rey” e se torna mais forte o desenvolvimento harmônico e integrado das comunidades às quais se vinculam. Da óptica de seu líder, “não podemos parar. Temos que produzir e estender-nos a todos os destinos, usando as patentes que temos inclusive para comercializar com negócios privados, interessados em um produto inteiramente cubano, que possa chegar às mãos daqueles que nos visitam”.
Igualmente, Yordanis Rey repassa as contas das vendas na Ilha, que se concentram em empresas de comércio e de gastronomia e serviços e em mercados agropecuários. “Em Havana não temos presença, mas estamos na fase de contratação. Os maiores mercados são Granma, Holguín, Las Tunas, Ciego de Ávila e Camagüey”, acrescenta.
Registrada como uma pequena indústria de referência nacional e possuidora de boas críticas, “Bodegas del Rey” se mantém fiel às suas origens e, ao tempo, abre os olhos ao turismo e incentiva o degelo dos preconceitos em torno do consumo de vinho artesanal. Sem deixar de se concentrar nos fermentados, este empreendedor homem quer chegar a elaborar molho de soja, tem em experimentação uma linha de vinho de arroz e procura novos fornecedores de matérias primas, quer sejam artesãos, produtores privados ou empresas estatais.
Evocando a tarde em que soube pela primeira vez o que era o vinho, lá em casa do pai, Yordanis Rey aposta em beber de maneira responsável. “Há muitas bebidas fortes que potencializam o alcoolismo, mas o vinho é um complemento, algo saudável, se for tomado com medida. É um tesouro que também se consegue dar em Cuba”, afirma.







